quarta-feira, 3 de julho de 2013
Modelo de operadora móvel virtual não decola
Por Ivone Santana | De São Paulo
Wilson Otero, da Porto Seguro/Datora: rede da TIM para atender clientes
Três anos atrás, o modelo das operadoras móveis de redes virtuais parecia uma boa proposta para o país aumentar a competitividade na telefonia. Qualquer empresa pode ser uma MVNO: basta alugar infraestrutura das grandes operadoras para oferecer aos usuários. Exatamente por essa facilidade, o modelo despertou polêmica até 2010, quando foi regulamentado no país. As teles tradicionais reclamavam que tinham de investir pesadamente em redes das quais outras empresas se aproveitariam mais tarde. Para muitas autoridades, esse argumento era apenas uma maneira de impedir mais competição. Agora, a sensação é de que houve muito barulho por nada.
A expectativa original era que até o fim de 2012 cem pedidos de MVNO tivessem sido encaminhados à Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), mas só quatro empresas solicitaram licenças até agora. Dessas, apenas a Porto Seguro Conecta entrou em operação. Os serviços começaram no início do ano, e a empresa encerrou o semestre com 90 mil chips ativados.
Para parte do mercado, o cenário mostra que a tentativa foi um fracasso. Essa é avaliação de uma alta autoridade do governo, que prefere não ser identificada. Outros, no entanto, são menos enfáticos e preferem dizer que a "adesão está mais lenta que a esperada".
O lançamento de três operadoras virtuais está programado para este ano: Datora, Sisteer e Terapar. Outras seis empresas, entre as quais os Correios, estão em meio ao processo para se habilitarem ao serviço antes de formalizar o pedido de licença - como requer a regulamentação -, com previsão de serem ativadas até 2014.
Mesmo com dez licenças de operações virtuais, o país atingirá apenas 10% da meta prevista pela Anatel e pelo Ministério das Comunicações, que fizeram um longo trabalho de prospecção e visitaram empresas em outros países antes de criar o modelo brasileiro.
As coisas, porém, não correram dentro do esperado. Problemas na definição de como o serviço seria tributado e atrasos na regulamentação do Plano Geral de Metas de Competição, além de normas estabelecidas posteriormente, refrearam o ânimo dos interessados.
A projeção, agora, é bem mais modesta, embora poucos se sintam à vontade em fazer novas previsões. A consultoria espanhola Everis, que responde por projetos de MVNO em vários países, foi uma das companhias que estimou, em 2010, que poderia haver mais de cem pedidos de licença para o serviço no Brasil. Agora, o sócio Marco Galaz revisou seus cálculos para o Valor. Em vez de um número fechado de competidoras, a expectativa é que, em cinco anos, as empresas de rede virtual poderão representar de 5% a 10% do mercado, em número de usuários.
O estudo anterior da Everis, que está presente em 13 países, tomou por base o histórico do serviço na Europa, basicamente da Espanha, onde as redes virtuais se expandiram fortemente, embora tenham passado, posteriormente, por uma consolidação. Hoje, restam no máximo 15 empresas virtuais no país. No Brasil, a complexidade regulatória e a bitributação do serviço, dependendo do contrato, adiaram a entrada das novas empresas, disse Galaz. Segundo ele, existem cerca de mil MVNOS em operação no mundo. Nos EUA e na Europa, essas empresas detêm de 5% a 7% de participação de mercado. Na América Latina há 20 operações em funcionamento, o equivalente a 0,05% do mercado.
"Só agora estamos conseguindo resolver o caso da bitributação nas duas partes [operadora de origem e virtual]", disse o presidente da Anatel, João Rezende. Coube ao Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) realizar estudos sobre o assunto e ver a maneira mais justa de se recolher ICMS, PIS e Cofins, para não onerar o serviço ao usuário. A questão não foi prevista na regulamentação.
A Conecta não teve problema com impostos. Se contratasse todo o serviço de uma tele tradicional, a companhia estaria sujeita à bitributação. Em vez disso, a Conecta contratou apenas a frequência da TIM, passando a oferecer serviços próprios. "Com isso, não há bitributação", disse Wilson Otero, representante dos acionistas da Datora Telecom na Conecta. A Datora detém 19,9% da Conecta e a Porto Seguro Serviços, 80,1%.
"De fato, esperávamos um grande sucesso de MVNO, mas o ritmo foi mais lento que o esperado", disse Miriam Wimmer, diretora do departamento de serviços de universalização de telecomunicações do Ministério das Comunicações. "Mas não atribuímos isso só à questão tributária, apesar de ela ser relevante."
Miriam discorda, no entanto, que o modelo tenha fracassado. "É ainda incipiente, mas com grande potencial. Temos feito esforços para torná-lo mais atraente", disse.
Um dos exemplos disso é que na licitação da faixa de frequência de 2,5 gigahertz (GHz), destinada a 4G, e 450 megahertz (MHz), para áreas remotas e rurais, no ano passado, uma das obrigações das empresas vencedoras foi propor aceitar uma MVNO.
Greg Descamps, sócio da Sisteer na América Latina e executivo-chefe da Sisteer do Brasil, também não fala em fracasso, mas no que define como uma "decolagem lenta".
A questão tributária gerou dúvidas porque há dois modelos diferentes de licença para MVNO, com tributação distinta. O credenciado é um representante comercial, não é prestador de serviço de telecomunicação, então se enquadra no regime tributário geral, diz o ministério, portanto sem ICMS, embora a decisão seja dos órgãos competentes. O autorizado, ao contrário, é uma empresa de telecomunicações que tem uma outorga da Anatel e se envolve em duas prestações de serviços, por isso surgiu uma discussão sobre uma possível compensação do imposto.
No caso de telecomunicações, há o convênio ICMS 126/2008 que estabelecia que só incidiria ICMS no preço do serviço cobrado do usuário, uma regra sem cumulatividade, segundo Miriam. Em abril, o convênio foi alterado. Desde então, o ministério avalia os impactos dessa mudança, sem conclusão até o momento. "Não cabe ao Ministério das Comunicações estabelecer as implicações da política tributária. Nosso papel é facilitar para que os modelos de negócios deslanchem, para que haja diálogo entre o setor privado e os órgãos fazendários, de municipal a federal", disse Miriam.
Para a TelComp, organização que representa 42 operadoras de todos os portes, algumas propostas poderiam estabelecer um modelo mais eficiente: simplificar a regulamentação, com apenas um tipo de licença; criar um mercado de atacado de minutos, em que as donas de rede tivessem que participar; desonerar os impostos das operadoras de origem, que poderiam oferecer preços menores às MVNOs, as quais pagariam os impostos. "É como atua toda cadeia produtiva de vários setores; faz o diferimento, para não haver cumulatividade e empurra os impostos para o fim da cadeia, o que evita duplicidade", disse João Moura, presidente da TelComp.
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