Nos mais de cem anos de existência, o carro mudou muito pouco em relação a seu DNA
em 26/11/2014 às 14h02
Só
há poucos anos tomávamos conhecimento de que a população mundial estava
mais urbana que rural. Foi precisamente em 2008 que ocorreu a virada...
Uma tendência consistente e irreversível. Seremos 70% urbanos em 2050.
No movimento de passar de uma sociedade rural para uma sociedade urbana,
mudamos também o paradigma de transporte e força: abandonamos o
horse-power biológico e o substituímos pelo horse-power mecânico. Fomos
dos cavalos aos carros. Mas... O que, de fato, mudou?
A sociedade centrada no cavalo tinha lá seus problemas. Diga-se de
passagem, bem parecidos com os que temos hoje. Em 1894 Londres foi o
palco (registrado) do início do fim deles entre nós... Os cavalos sendo o
principal meio de transporte, como hoje, causavam congestionamento nas
ruas, atropelavam pedestres e deixavam as vias públicas poluídas.
Na
verdade, entulhadas de estrume. O problema do estrume nas ruas de
Londres tornou-se tão agravante que recebeu o nome histórico de “A grande crise do cocô de cavalo”.
Além do estrume e urina, o próprio animal também era fonte de sujeira:
quando morria, a carcaça era com frequência abandonada na rua, ao léu,
na expectativa de ser recolhida pelo poder público.
Apareceram então os motores a combustão e passamos a usar carroças
sem cavalos, com pneus a ar e suspensão, uma evolução. Para poucos, a
princípio. Até Henry Ford declarar que construiria um carro para as
grandes multidões. E efetivamente construir... E popularizar entre nós, o
carro!
Porém, nos seus mais de cem anos de existência, o carro mudou muito
pouco em relação a seu DNA original: são ainda movidos por motores de
combustão interna, alimentados por petróleo, dirigidos e controlados
mecanicamente, e operados como dispositivo isolado. Mais interessante é
que aos poucos, nós, pessoas, atribuímos ao carro outros significados (e
utilidades). Passamos a exigir que fossem maiores, mais rápidos, mais
fortes. Uma vestimenta única, para cada um de nós. Talvez a mais cara.
Certamente a mais pesada.
Como resultado, os velhos problemas voltaram: congestionamento,
poluição (agora do ar) e carcaças de metal... E um agravante, os
acidentes fatais. Em 2011, os acidentes de trânsito provocaram só nos EUA 32 mil mortes. No Brasil, foram 43 mil e no mundo, 1,24 milhões, de acordo com o Global status report on road safety 2013 do World Health Organization.
Mas para nossa sorte, “estar presente” também mudou de significado...
Estamos na era da informação, com o surgimento dos smartphones, ser
móvel é estar conectado, à rede! O choque é natural: a indústria
automotiva e de “conectividade” encontram-se em plena colisão. Oferecem
“quase” o mesmo, de formas diferentes (presenças físicas versus presença
virtual). Porém, o usuário, claro, quer ambos: a experiência de estar
conectado, móvel, enquanto em deslocamento.
No metrô, no ônibus é possível. E no carro? A nossa nova paixão só
distrai, provocando ainda mais acidentes. Em 2011, nos EUA, o uso dos
smartphone ao volante já respondiam por 3% das colisões no trânsito... O
simples fato de enviar um SMS aumenta o risco de acidentes em 23 vezes.
Mas como resolver? Proibir o uso dos aparelhinhos certamente não é a
solução! Talvez, como nos ônibus, ou no metrô, precisamos de “alguém”
guiando os carros para nós. É exatamente o que propõe Silvio Meira, se o
trânsito mata, tirem os motoristas do volante. É o que tenta fazer
Google (vídeos)
e um punhado de outros fabricantes, como Honda, Volvo, Mercedes e GM
(entre outros). Não colocando James no nosso lugar, mas com carros
conectados e autodirigidos. Para estes novos e antigos atores do
mercado, os carros conectados e autodirigidos são muito mais que
extensões da experiência de mobilidade e diversão. São olhos, ouvidos,
braços e pernas muito mais aptas e focadas na atividade de dirigir. Para
as cidades, serão sensores ambulantes, capazes de detectar buracos e
alagamentos, ou mesmo passar informações sobre o trânsito, clima,
violência, e o que mais nossa imaginação permitir (veja o que foi produzido no Summer Job do CESAR em 2013).
Ao se tornar um dispositivo computacional e entrar para a rede, o
carro perde uma de suas características principais - o de dispositivo
isolado, e ganha muitas outras (veja artigo que publicamos nesta coluna sobre IoT).
Irá evoluir gradativamente sua capacidade de processamento e
comunicação, com softwares cada vez mais complexos, ao ponto de
conseguir detectar atenção do motorista, se comunicar com a
infraestrutura, com pedestres e com outros veículos, até conseguir, por
fim, tomar o controle da direção. Sim, no futuro, próximo eu diria,
vamos selecionar carros não mais pela potência do motor e itens de
segurança reativos (airbags e freio abs). Mas pelo alcance do radar, a
latência da comunicação, resolução das imagens em pixels e capacidade de
evitar acidentes.
No processo, é possível que também deles consigamos extrair a alma
(software) do corpo (hardware), como fez a indústria de computadores
(mainframes) na década de 80. É o que quer o Silicon Valley, e o que
Detroit tenta evitar. Mas é daí que virá ainda a verdadeira e grande
revolução da indústria automobilística: a divisão entre os que produzem a
“inteligência”, o sistema operacional dos carros, daqueles que fabricam
apenas as latinhas, o carro como conhecemos hoje. Será? Ou você acha
que Google está nesta brincadeira para vender carros?
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