Por Gustavo Sumares - em 26/06/2015 às 15h55
O relatório “State of the Internet”, elaborado pela empresa Akamai, revelou que a velocidade média da internet brasileira é de 3,4 Mbps, dando ao País o 89º lugar no ranking mundial. O índice fica abaixo da média mundial (5 Mbps) e de vizinhos como Argentina, Chile e Uruguai.
O resultado é preocupante, considerando-se que o Brasil é a sétima maior economia do mundo e que o acesso de qualidade à internet é um componente essencial de qualquer infraestrutura produtiva atual.
No entanto, segundo Fabrício Tamusiunas, gerente de projetos do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (órgão implementa os projetos e decisões do Comitê Gestor da Internet - CGI), esse número - 3,4 Mbps - é um resumo breve de uma realidade muito mais complexa.
“Outro mundo”
Por que nossa conexão deixa tanto a desejar se comparada, por exemplo, à da Coreia do Sul (que foi a primeira colocada no estudo da Akamai, com média de 23,6 Mbps)? Segundo Tamusiunas, a internet do país asiático é “outro mundo” em comparação com a nossa, por uma série de motivos.
A conexão de qualidade é um aspecto bastante importante da cultura da Coreia do Sul. Tanto que o governo estabelece uma série de metas audaciosas de velocidade às quais as operadoras locais precisam atender para seguir oferecendo serviços. Existem também políticas de incentivo fiscal para que o preço dos planos se tornem mais acessíveis aos consumidores.
O país também tem uma densidade populacional considerável, é bastante urbanizado, possui um sistema de educação pública muito bom e uma série de grandes indústrias. Esses fatores, aliados aos incentivos do governo, contribuem para formar uma população bastante exigente com os serviços de rede, exigências que as operadoras precisam atender para se manter funcionando.
O governo do país investiu bastante também em infraestrutura: em 1995, quando apenas 1 em cada 100 sul-coreanos tinha acesso à internet, o governo começou um projeto de 10 anos para investir em infraestrutura no país inteiro. Graças a isso, atualmente 84% da população é conectada, e cerca de 80% com banda larga.
Além de investir na infraestrutura de rede do país, o governo também facilitou a entrada de empresas que desejavam investir neste setor, criando um ambiente de competição acirrada que beneficiou o desenvolvimento da rede no país.
E, segundo Tamusiunas, isso ajudou a diminuir o preço para o consumidor. “Uma vez que a infraestrutura já está criada, esse custo deixa de existir, e o preço fica mais barato”, diz. Ele comenta também que as operadoras chegam a oferecer planos de 1 Gbps por lá, e o governo tem planos de, até 2020, levar as operadoras a oferecer planos de 10 Gbps.
No Brasil...
Aqui, por sua vez, esse investimento em infraestrutura não foi tão considerável. Grande parte das capitais do país está passando pelo processo de cabeamento por fibras, que permite às operadoras oferecer planos mais rápidos nas regiões onde a fibra chega. O processo, no entanto, ainda é relativamente lento.
Além disso, trata-se também de um investimento considerável. Segundo Tamusiunas, alguns dos equipamentos de rede necessários para se amadurecer a infraestrutura precisam ser importados, e chegam ao Brasil pagando quase 100% do valor de custo em impostos. Além de dificultar o desenvolvimento da infraestrutura, esse valor acaba sendo frequentemente repassado para os consumidores.
Isso dificulta, também, a implementação da infraestrutura em regiões menos urbanizadas, e acaba contribuindo para a perpetuação das desigualdades de acesso à rede que existem entre as regiões do país. Uma revisão dos tributos que incidem sobre esses equipamentos poderia, portanto, ajudar a acelerar a modernização de nossa rede.
Mas ainda dá tempo de resolver o problema. Tamusiunas se lembra da história de um grupo de provedores na região oeste de Santa Catarina que se uniram em um consórcio para custear a passagem de cabros de fibra óptica pela região. Com isso, conseguiram oferecer a todos os seus clientes conexões de 10 Mbps pelo mesmo preço que eles antes pagavam por 2 Mbps.
Algo da competição que acontece entre as empresas sul-coreanas também está começando a aparecer em algumas das regiões brasileiras. “Quando a Tim começou a oferecer planos de fibra com velocidades muito maiores que as da Vivo por preços semelhantes, a Vivo precisou correr atrás também”, comenta.
A empresa responsável pelo estudo
A Akamai é uma empresa americana de serviços na nuvem e possui uma rede de servidores espalhados pelo mundo. Ela aluga espaço nesses servidores para clientes que desejem acelerar o funcionamento de seu site.
Como os servidores da Akamai estão bem distribuídos, a empresa consegue criar “cópias” dos sites de seus clientes em servidores mais próximos dos de seus usuários, o que reduz o tempo necessário para a informação chegar até eles. Entre seus clientes e ex-clientes estão a Apple, a Microsoft e a Adobe.
A empresa consegue monitorar a velocidade com a qual os usuários baixam conteúdo de seus servidores. Quando alguém no Brasil baixa uma atualização de segurança do Windows, por exemplo, ela vem pelo servidor da Akamai, e a empresa registra a velocidade desse tráfego. Com a imensa quantidade de informações sobre o tráfego de dados nos países onde atua, ela consegue então montar o relatório.
Existem diversos fatores que influenciam a velocidade com a qual um usuário consegue baixar conteúdo de um servidor da Akamai. Um deles, obviamente, é o plano contratado. Mas, segundo Tamusiunas, o tamanho do arquivo também afeta a velocidade: “o usuário só consegue atingir o máximo da velocidade contratada em downloads maiores”, comenta.
Por esse motivo, o tamanho dos arquivos baixados influencia o resultado do estudo. Se, no país A, os usuários baixarem apenas arquivos pequenos dos servidores da Akamai, e no país B eles baixarem apenas arquivos muito grandes, a velocidade média no país B será maior - mesmo se a velocidade contratada pelos usuários for a mesma. Esse é um dos motivos que leva Tamusiunas a afirmar que “a metodologia [do estudo] não é tão aberta quanto deveria ser”.
O que faltou
Seria necessário, portanto, conhecer o tamanho médio dos arquivos baixados em cada país para poder compreender melhor o resultado do estudo. Nos Estados Unidos, onde mais pessoas usam os serviços da Apple e da Adobe que no Brasil, pode-se imaginar que a média do tamanho dos arquivos seja maior, uma vez que mais usuários precisarão baixar a atualizações do iOS e do Photoshop, por exemplo. No entanto, a Akamai não divulga esse dado.
Outro dado que a empresa não divulga é o desvio padrão da velocidade em cada país. Essa medida estatística mostra o quanto de variação existe em relação à média. Em outras palavras, ela ajudaria a mostrar se o número médio realmente reflete bem a realidade dos dados. Por exemplo, se todas as conexões do Brasil tivessem velocidade de 3,4 Mbps, o desvio padrão seria zero. Quanto mais as conexões variam, maior o desvio padrão. Mas esse número também não é divulgado.
Isso é especialmente problemático no caso do Brasil, que é tão grande e possui realidades tão diferentes. Tamusiunas comenta que, segundo medições do SIMET (Sistema de Medição de Tráfego de Internet, projeto que ele coordena), 30% das conexões nas regiões Sul e Sudeste do país têm velocidades médias de 10 Mbps a 15 Mbps.
As duas regiões são as mais bem atendidas pela infraestrutura de rede, seguidas pela região Centro-Oeste, a região Nordeste e, finalmente, a região Norte. Na região Norte, os dados do SIMET mostram que a maioria das conexões fica abaixo de 3 Mbps, com 25% abaixo de 1 Mbps.
“Não faz sentido comparar o Brasil com o Uruguai; o Uruguai é do tamanho do Rio Grande do Sul”, comenta Tamusiunas, que acredita que seria necessário que o estudo fizesse uma análise do Brasil por regiões, assim como a empresa fez dos Estados Unidos
Internet móvel
Com relação à internet móvel também abordada pelo estudo da Akamai, o Brasil ficou na 82ª posição do mundo, com uma média de 2,5 Mbps, dessa vez atrás de Venezuela e Paraguai - algo curioso, já que a média de velocidade das conexões fixas desses países estava entre as piores da América Latina.
A própria tecnologia das redes 3G e 4G no entanto, segundo Tamusiunas, ajuda a explicar essa distorção: “quanto mais gente acessa a rede móvel pela mesma torre, pior o serviço”. Nesse caso, portanto, o que pode acontecer é que, como a porcentagem das populações da Venezuela e do Paraguai que têm acesso a essas redes é pequena, a velocidade da conexão, para esses usuários, é bastante boa.
Isso permite arriscar também uma explicação alguns números impressionantes, como o da velocidade pico de conexão das redes móveis da Austrália: no estudo da Akamai, esse número chegou a incríveis 149,3 Mbps. Isso poderia acontecer, de acordo com Tamusiunas, em uma região pouco povoada (que a Austrália tem em grande quantidade, já que boa parte de seu território é um deserto) atendida por muitas torres ou microcélulas.
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